A doença renal crônica (DRC) figura entre os problemas de saúde que mais matam no planeta, de acordo com pesquisa da Universidade de Nova Iorque. O levantamento coloca a enfermidade na nona posição do ranking global de mortalidade, com cerca de 1,5 milhão de óbitos registrados em 2023, e estima que 14% da população mundial apresente algum estágio da doença.
A DRC caracteriza-se pela perda gradual da capacidade dos rins de filtrar o sangue e remover substâncias tóxicas do organismo. O nefrologista Renato Pontelli, responsável pelo setor de hemodiálise do Hospital Nossa Senhora Auxiliadora, explica que essa evolução costuma ser silenciosa: grande parte dos pacientes não percebe alterações nas fases iniciais e descobre o diagnóstico apenas quando a função renal já se encontra comprometida.
O quadro clínico é classificado em cinco estágios. Nos graus 1 e 2, a insuficiência é leve e raramente causa sintomas. A progressão para os níveis 3 e 4 indica perda funcional significativa, enquanto o estágio 5 exige terapias de substituição, como hemodiálise ou transplante. Os sintomas mais comuns englobam cansaço persistente, fraqueza, inchaços, alterações na urina, coceira e dificuldade de concentração.
Entre os principais fatores de risco, o especialista destaca hipertensão arterial, diabetes, obesidade, sedentarismo, tabagismo e uso indiscriminado de medicamentos, especialmente anti-inflamatórios. Pontelli alerta que o abuso desses fármacos e o controle inadequado da glicemia aceleram a deterioração dos rins, elevando a probabilidade de complicações.
Medicamentos de classe mais recente, como os análogos do GLP-1 – entre eles Ozempic e Mounjaro –, têm demonstrado efeito positivo na contenção da progressão da DRC. Segundo o nefrologista, esses fármacos auxiliam o controle glicêmico e, de acordo com dados do estudo Flow, reduzem o risco de necessidade futura de hemodiálise.
Em Três Lagoas, Mato Grosso do Sul, levantamento local indica que mais de 8,3 mil moradores apresentam algum grau de comprometimento renal. No Hospital Nossa Senhora Auxiliadora, unidade de referência regional, mais de 100 pacientes realizam hemodiálise regularmente. Do total, 84 são residentes na própria cidade e os demais vêm de municípios vizinhos como Brasilândia, Água Clara, Selvíria e Arapuá.
A sessão de hemodiálise dura, em média, quatro horas e costuma ser repetida três vezes por semana. O procedimento substitui parte da função renal ao filtrar o sangue do paciente em equipamento externo e devolvê-lo ao organismo já livre de toxinas. Embora seja essencial para a sobrevivência em estágios avançados, o tratamento ainda enfrenta preconceito e receio, segundo relatos de pacientes atendidos na unidade. Pessoas que convivem com o procedimento há vários anos relatam que a terapia possibilitou retomada de atividades cotidianas e melhoria da qualidade de vida.
Além da diálise, o transplante renal é alternativa para certos perfis clínicos. Em 2025, o Hospital Nossa Senhora Auxiliadora registrou cinco transplantes concluídos até o momento, número que evidencia avanços nos protocolos de captação de órgãos, mas também reforça a necessidade de ampliar campanhas de conscientização sobre doação e diagnóstico precoce.
Para reduzir a incidência e a mortalidade associadas à doença, especialistas recomendam medidas preventivas de baixo custo e alto impacto. Entre elas estão alimentação equilibrada com baixo teor de sal, monitoramento regular da pressão arterial e da glicose, prática de atividade física, manutenção do peso adequado, cessação do tabagismo e moderação no consumo de bebidas alcoólicas. A utilização de medicamentos deve ser supervisionada por profissional de saúde, evitando-se o uso prolongado de anti-inflamatórios sem indicação.
As estimativas globais reforçam que a detecção precoce é decisiva para conter a evolução da DRC. Exames simples, como dosagem de creatinina no sangue e análise de proteína na urina, identificam alterações funcionais antes que surjam sintomas. Para quem já possui fatores de risco, consultas regulares ao clínico geral ou nefrologista permitem ajustes terapêuticos capazes de preservar os rins e evitar complicações que, em estágios finais, podem levar à dependência vitalícia de hemodiálise ou exigir transplante.
Com a doença renal crônica estabelecida entre as dez principais causas de morte no mundo, autoridades de saúde, profissionais e populações locais reforçam a importância de estratégias de prevenção, diagnóstico antecipado e acesso a tratamentos eficazes para reduzir o impacto dessa enfermidade silenciosa.







