A aplicação imediata da vacina antirrábica após mordeduras de cães e gatos não é mais regra na rede pública de saúde. De acordo com novas orientações do Ministério da Saúde, a imunização só deve começar de forma automática quando o animal agressor não puder ser acompanhado. Caso exista a possibilidade de observação, o protocolo determina monitorar o estado de saúde do animal por dez dias antes de decidir pela profilaxia. A mudança consta na Nota Técnica nº 8/2022, que revisa o manejo de exposições humanas ao vírus da raiva em todo o país.
A atualização ganhou destaque depois de sucessivos ataques de cães da raça pitbull em Campo Grande (MS). A vendedora Nathalia Mendieta, 26 anos, foi mordida ao tentar separar uma briga entre animais e procurou atendimento na UPA Nova Bahia. No local, recebeu a informação de que não tomaria a vacina de imediato em virtude das novas recomendações. A Secretaria Municipal de Saúde confirmou a orientação, ressaltando que profissionais de vigilância captaram o endereço do tutor do cão e acompanharão tanto a evolução do ferimento quanto o estado de saúde do animal ao longo da observação.
Critérios para início da imunização
Conforme a nota técnica, a conduta diante de mordeduras ou arranhaduras depende basicamente de dois fatores: a espécie do agressor e a viabilidade de observação clínica. Quando se trata de cães ou gatos com dono identificável, a indicação é monitorar o animal por dez dias. A vacinação e o uso de soro antirrábico ou imunoglobulina humana passam a ser recomendados apenas se o animal apresentar sinais compatíveis com raiva, morrer ou desaparecer nesse intervalo. Caso o cão ou gato permaneça saudável, a profilaxia é dispensada.
Em situações em que o agressor não pode ser observado — por exemplo, animais de rua sem identificação — a imunização deve começar imediatamente. O esquema profilático para esses casos inclui a aplicação de soro antirrábico ou imunoglobulina, quando indicado, e quatro doses de vacina nos dias 0, 3, 7 e 14.
Foco em animais silvestres
O Ministério da Saúde fundamenta a revisão das diretrizes na mudança do perfil epidemiológico da raiva no Brasil. Nos últimos dez anos, a maioria dos registros de raiva humana foi associada a animais silvestres, principalmente morcegos, e não a cães. Por esse motivo, todo contato com morcegos ou outros mamíferos silvestres, mesmo domiciliados, passou a ser considerado acidente grave. Para essas ocorrências, o protocolo prescreve o início imediato do esquema com soro e quatro doses de vacina, independentemente da gravidade aparente da lesão.
O documento também amplia a vigilância sobre animais de produção, como bovinos, suínos e equídeos. Nesses casos, a necessidade de profilaxia deve ser analisada conforme o tipo de exposição e o cenário epidemiológico regional. A medida busca responder à circulação do vírus em áreas rurais e reduzir o risco de transmissão às pessoas que manipulam ou convivem com esses animais.
Orientações de primeiros socorros
Apesar da mudança nos prazos de vacinação, a recomendação de cuidados imediatos após qualquer mordida ou arranhadura permanece. O Ministério da Saúde orienta lavar o ferimento com água corrente e sabão em abundância por, no mínimo, 15 minutos, além de procurar atendimento na unidade de saúde mais próxima para avaliação profissional. Lavagem cuidadosa reduz significativamente a chance de infecção e faz parte do protocolo de prevenção.
Racionalizar imunobiológicos
A nota técnica também menciona a necessidade de racionalizar o uso de imunobiológicos, diante da escassez mundial de vacina e soro antirrábico. Serviços de saúde devem registrar todas as doses aplicadas e utilizar as nomenclaturas oficiais SAR (Soro Antirrábico) e IGHAR (Imunoglobulina Humana Antirrábica) nos prontuários. Segundo a pasta, a estratégia visa assegurar estoque suficiente para acidentes de maior risco, especialmente envolvendo fauna silvestre.
Com a nova diretriz, autoridades sanitárias reforçam que o acompanhamento de cães e gatos em observação deve ser rigoroso, com visitas periódicas de agentes de vigilância ou apresentação dos animais em unidade veterinária. Caso ocorram sintomas compatíveis com raiva, como alteração de comportamento, salivação excessiva ou dificuldade de deglutição, a orientação é iniciar o esquema de vacinação imediatamente e ampliar a investigação epidemiológica no local.
As secretarias estaduais e municipais de saúde já foram notificadas sobre a atualização e devem treinar profissionais para a aplicação uniforme do protocolo. Enquanto isso, a população é incentivada a manter cães e gatos vacinados anualmente, evitar contato com animais silvestres e buscar atendimento urgente em qualquer situação de exposição suspeita ao vírus da raiva.









